Relação com fundação privada dá origem a escândalo envolvendo reitor e professores da Universidade de Brasília
A Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), principal fundação de apoio que atua na Universidade de Brasília (Unb), está sendo investigada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) por vários delitos, incluindo desvio de verba e função; “sobra” de recursos de mais de R$ 24 milhões; e dinheiro gasto na decoração do apartamento funcional, ocupado até o último dia 12 pelo reitor Thimothy Mulholland. As notas fiscais comprovam que foram gastos mais de R$ 470 mil no imóvel, localizado na Asa Norte da cidade de Brasília.
Recentemente, a Promotoria de Tutela de Fundações e Entidades de Interesse Social do MPDFT recorreu da decisão judicial que afastou o professor Nelson Martin da Presidência do Conselho Fiscal da Finatec, por entender que a ação de destituição de dirigentes, proposta no dia 21 de janeiro, deve ser aplicada a todos os cinco diretores da instituição e não apenas a um. Pelo fato de as denúncias de irregularidades serem graves – contratações sem licitação, desvio de função, apropriação indébita -, o MPDFT está propondo à Justiça a instalação de uma “administração provisória”, uma espécie de auditoria para fazer o levantamento do real patrimônio da Finatec.
Em nota de esclarecimento, a Finatec assegura que a sobra de dinheiro é proveniente de “uma excelente administração dos recursos financeiros e das relações apropriadas de trabalho”. A Fundação explica que as quantias em caixa são guardadas para futuros pagamentos de encargos e eventuais indenizações trabalhistas de um contrato firmado, em 1998, entre a Fundação Universidade de Brasília (FUB), o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e a Finatec.
Quanto ao montante destinado à decoração do apartamento do reitor, a Finatec diz não ser a responsável pela distribuição de investimentos do Fundo de Apoio Institucional (FAI). Segundo a Fundação, são as resoluções do Conselho de Administração da própria UnB que determinam quanto e onde os recursos serão empregados. Portanto, a quantia de dinheiro aplicada na decoração do apartamento funcional do reitor teria sido aprovada pelo próprio colegiado da instituição.
Fundações driblam lei de licitações
Seções sindicais de docentes das Ifes de todo país já há algum tempo denunciam a relação promíscua entre as fundações de direito privado, formada muitas vezes por docentes da própria instituição, e as universidades. Com a justificativa de estar agilizando a realização de projetos de pesquisa, obras de infra-estrutura e contratação de serviços de terceiros, as reitorias canalizam verbas orçamentárias de custeio e fomento para as fundações administrarem. Assim, as reitorias conseguem driblar a lei 8.666, que institui normas para licitações e contratos da administração pública. No entanto, essa manobra administrativa acaba por escamotear todo um processo de gastos públicos, desde a escolha de empresas para prestação de serviços, de equipes de consultores, coordenadores de projetos, até a gerência e realização dos mesmos.
A promiscuidade do dinheiro público sob a gerência de uma instituição privada fica mais clara quando se evidencia que a fundação administra e aplica verbas públicas da universidade e está, ao mesmo tempo, submetida às resoluções de um conselho de administração da própria IFES. As investigações se debruçam no fato de que os integrantes do Conselho Administrativo da UnB são os mesmos docentes que ocupam cargos de direção na Finatec. Além disso, a fundação movimenta R$ 100 milhões por ano, mas investe apenas R$ 750 mil por ano em bolsas de pesquisa, o que chama a atenção dos promotores do Ministério Público.
A ocupação de cargos administrativos de fundações por docentes servidores públicos com dedicação exclusiva fere o decreto 94.664 de 1987, a que se refere a lei 7.596 do mesmo ano. Pela legislação, a dedicação exclusiva (40hDE) exige do docente total dedicação ao magistério, vedando a este o exercício de qualquer outro cargo ou emprego público ou privado.
Altas remunerações passam pelas fundações privadas
O Ministério Público mergulhou de cabeça nas investigações das irregularidades da Finatec. Para os promotores que fazem a denúncia, os dirigentes da UnB se utilizam da fundação para a prática de irregularidaes e obtenção de vantagem pessoal, contrariando o propósito da entidade de apoio que seria de fomentar o ensino, a pesquisa e a extensão. “O objetivo principal do Ministério Público é o afastamento dos cinco dirigentes da Finatec. A questão dos cargos ocupados por docentes de dedicação exclusiva também é ilegal, mas não é o foco no momento”, afirmou o promotor Ricardo Souza, a frente da ação.
Apesar de afirmar que a relação de servidores docentes e técnicos com as fundações privadas ainda não ser o foco das investigações do Ministério Público, o processo aberto pelos promotores Ricardo Souza, Gladaniel Palmeira e Nelson Faraco no Tribunal de Justiça do Distrito Federal revela a contratação de parentes de docentes/servidores para a prestação de serviços para a UnB através da Fundação. Além disso, o MPDFT acusa a administração da Finatec de pagar salários com valores bastante altos a servidores. Segundo o documento judicial, ocorreram “pagamentos de quantias vultosas a professores/servidores pertencentes ao quadro da FUB, enquadrados no regime de dedicação exclusiva, por serviços prestados em contratos firmados entre a Finatec e o Poder Público, em total contrariedade às disposições da Lei nº 8.958/94”.
Assembléia de professores da UnB pedirá afastamento do reitor
No último dia 15, o Conselho de Representantes da Adunb-SSind aprovou a recomendação de que Thimothy seja afastado do cargo de reitor. A proposta será aprovada em assembléia dos docentes da universidade ainda nesta semana.
A diretoria da Seção Sindical dos Docentes da Universidade de Brasília publicou, ainda, um documento reaafirmando a posição contrária às fundações e a defesa do fortalecimento da “universidade pública, gratuita, socialmente referenciada com financiamento totalmente oriundos do Estado e não por meio de intermediários”.
Fonte: ADUFRJ




