Esta foi a manifestação que apareceu numa lista de técnicos de nível superior das universidades e que nada mais mostra do que o triste perfil de uma categoria que, pelas próprias mãos, vem desmontando toda a sua vida laboral. Uma boa parte de responsabilidade nesta situação pode ser atribuída a algumas lideranças que, desde 2003, mais existem para defender as políticas do governo do que para fazer o embate de classe. Mas, uma outra parte da responsabilidade está a cargo dos trabalhadores que, afinal, não são tão ingênuos assim. E são os trabalhadores, na base, que decidem sobre as questões que envolvem as negociações com o governo.
Foi assim em 2003, quando, no meio de uma greve que faziam de forma unificada com outros trabalhadores federais, aceitaram discutir uma proposta de plano de cargos e salários que caiu sobre a mesa de forma totalmente inusitada. A privatização foi deixada de lado e os trabalhadores passaram a se debruçar sobre as tabelas do mais tarde viria ser o PCCTAE. Os grupos majoritários na Fasubra anunciavam aos quatro ventos que aquela tabela seria uma grande avanço, uma passo a mais na direção da carreira e que o governo inclusive aceitava a lógica da tabela do Plano de Cargo Único. Este era o maior triunfo, pois com a tabela do PCU ficava garantido o step constante, meta a muito almejada pelos trabalhadores.
Mas no meio do caminho havia os arautos da desgraças, as “mães dinás” que já apontavam os descaminhos do projeto e todos os problemas que ele iria trazer. Ninguém escutou. Em Santa Catarina houve até brigas, pessoas deixaram de se falar, outras chamaram de terroristas os que anunciavam os problemas, enfim, toda a sorte de mazelas que este tipo de ação desagregadora acarreta. E, ao final de tudo, foram os próprios trabalhadores que, por maioria – Santa Catarina foi contra – decidiram aceitar o tabelão.
Já no ano seguinte todos os furos apontados aconteceram. Um a um foram aparecendo e colocando mais confusão na já combalida categoria dos TAs. O primeiro ano do tabelão deixou os técnicos de nível superior com zero de aumento, enquanto outros, nas outras letras, recebiam polpudas melhoras no salário. Crise, choradeira, confusão. Tudo isso gerou até a proposta de criação de uma Associação dos Técnicos de Nível Superior. Foi um desconcerto geral. Os colegas se olhavam com ódios e isso foi gerando muito mal-estar. Na prática estava acabada a lógica dos reajustes lineares e iguais. Com a proposta governamental se abria a chance dos integrantes de cada letra da tabela fazerem suas lutas isoladas. Foi o salve-se quem puder. E foi decidido pelos trabalhadores.
A nova greve que os trabalhadores fizeram foi em cima do malfadado PCCTAE. Queriam ajeitar o monstro, como se isso fosse possível. Tira o VBC daqui, bota uma qualificação ali e, de novo, foi-se criando uma tabela diferenciada, no mesmo tom do “farinha pouca, meu pirão primeiro”. Nada além da lógica capitalista agindo em todos os lados. Os trabalhadores competindo entre si, se dividindo, desmontando o espírito de corpo. Os sindicalistas freqüentando os salões, aplaudindo o governo – salvo raras exceções. E o governo feliz da vida acumulando pontos na aprovação popular. Desfazia a organização de uma das mais poderosas forças trabalhistas e estava tranqüilo.
Pouco depois da greve ainda colocou a pá de cal. Definiu um reajuste bem maior para os Técnicos de Nível Superior e deixou o resto da categoria a ver navios. Mais um ponto para a desarticulação, para o fomento da raiva, da inveja. Os trabalhadores das universidades passaram a dançar no ritmo do “cada um no seu quadrado”. Até a proposta de racionalização passou a ser uma luta isolada de alguns trabalhadores que acabaram perdendo na divisão. Tudo muito bem orquestrado pelo governo, com o apoio irresponsável de uma boa parte das lideranças sindicais.
Agora, depois de milhares de reuniões da tal da mesa de negociação permanente, o governo, do alto dos seus 80% de aprovação, dá sua palavra final aos trabalhadores: é o fim da tabela do PCCTAE. Nada mais está definido. Agora, o governo pode fazer o que quiser, definir aumentos diferenciados para aqueles que, dentro das universidades, ele entender “estratégicos” . E é por isso que alguns os técnicos de nível superior comemoram com a triste frase: viva o fim do step constante. Porque eles acreditam que serão os de nível superior que serão os estratégicos. Sairão no lucro. O resto que se exploda.
Assim é. Enquanto lá no norte, berço do neoliberalismo, o sistema faz água e mostra que a idéia de privatização é o maior engodo do século, aqui no quintal os governantes insistem em entregar tudo para mãos privadas. Inclusive uma máquina cheia de gente dividida, gananciosa, prepotente e afinada com a lógica da competição a qualquer custo. É a famosa “classe média gosmenta” que não consegue ver o mundo além da sua janela. Que não se importa com a desgraça dos que estão fora da bolha protetora do trabalho, do salário certinho, da segurança. Então reagem assim, rindo, felizes, como o monstro nunca fosse lhes tocar.
É preciso que recuperemos a “mãe Diná”, embora poucos a levem a sério. Aqueles que hoje riem e comemoram mais uma derrota da classe trabalhadora também serão engolidos pelo monstro. É só esperar!
Por outro lado, no meio desta desagregação promovida pelo governo de Luis Inácio com apoio das lideranças sindicais, ainda há gente que luta e que está atenta. Gente que não se entrega por conta de uma ou outra derrota e que, unida, busca saídas coletivas. Estes são, como dizia Brecht, os imprescindíveis. Aqueles que secarão as lágrimas dos que hoje riem. Porque nunca abandonarão a luta da classe trabalhadora. Por nenhum dinheiro, por nenhum cargo.