Trabalhadores e estudantes debatem projeto nefasto das fundações de direito privado
“Pra Onde vai o SUS? O SUS e o Projeto de Fundação Estatal de Direito Privado”, foi o tema do debate promovido pelo DCE da UFSC, no auditório da reitoria, dia 3 de junho. Os debatedores, professora Clair Castilhos, do Departamento de Saúde Pública da UFSC, João Pedro Carreirão, presidente do Sindicato dos Médicos de Santa Catarina (SIMES), Rodrigo Borges, da coordenação do Sintufsc, e Flavio Magajewski, da Secretaria Estadual de Saúde, encontraram o auditório da reitoria praticamente lotado de estudantes e pessoas interessadas em aprofundar o debate sobre o PLP –92/2007, projeto que cria as fundações estatais de direito privado para administrar órgãos públicos.
Entulho da ditadura
João Pedro Carreirão, do Simes, foi o primeiro a falar. O médico apresentou um histórico do projeto de fundações. Segundo ele, á idéia do projeto nasceu das oficinas de trabalho do Ministério da Saúde e dirigentes de hospitais, realizadas a partir de setembro de 2005, com a finalidade de debater a crise nos hospitais.
Nas oficinas, ficou entendido que a forma de administrar os hospitais era inadequada, pois havia muitos “entraves” que dificultavam o trabalho. Daí surge a proposta de Fundações Estatais de Direito Privado, que segundo Pedro Carreirão, em sua proposta inicial, apresentada pelo deputado Pepe Vargas, do PT gaúcho, era bem simples:
“Autorizar a criação, mediante lei específica, de fundações sem fins lucrativos, integrantes da Administração Pública indireta, com personalidade jurídica de direito público ou privado, para desempenho de atividade estatal que não seja exclusiva de Estado; e determinar que podem ser constituídas fundações nas áreas de saúde e hospitais universitários, assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio ambiente, previdência complementar, comunicação social, e promoção do turismo nacional”.
Carreirão também apresentou o conceito da personalidade jurídica das fundações e explicou como elas funcionariam na prática. Para o médico a proposta de fundações estatais para administrar órgãos públicos de saúde e hospitais é muito parecida com a idéia da inovação da saúde, de 1964. “Fundamentada em um regime totalitário, assemelha-se muito com a proposta do Inamps” – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social, instinto em 1993.
Venda de serviço público
Segundo ele, o projeto de inovação de 1964 foi apenas atualizado e se contradiz, pois a administração é feita através de contatos de prestação de serviços, o que para ele significa a “venda de serviço público”.
Carreirão considera preocupante “toda e qualquer forma de parceria público privada”. Para ele a idéia de fundação pode soar como boa no início, mas “pode ser terrível no final”.
Ele acredita que buscar uma nova forma de administração pública reflete uma incompetência do governo. “Quanto maior a incompetência do governo, maior a busca de instrumentos privados”, destaca.
Pedro Carreirão também alerta que o PLP-092 já foi aprovado pelas comissões de Constituição e Justiça e de Cidadania – CCJC e Trabalho, Administração e Serviço Público – CTASP da Câmara dos Deputados e pode ser submetido à votação do plenário da casa a qualquer momento.
Também destaca que o projeto original já sofreu alterações e a nova versão inclui o ensino, a formação e cooperação internacional como áreas onde as fundações estatais de direito privado poderão atuar.
Segunda porta, privada, nos HUs
Clair Castilhos, do Departamento de Saúde Pública da UFSC, também condenou o PLP-092. A professora fez um breve histórico do SUS e lembrou que esta é uma proposta antiga, que começou o plano diretor de reforma do aparelho do Estado, de FHC, em 1995. E que, em 1997, ano saúde no Brasil, ganhou força com a elaboração de um documento pelo Ministério da Saúde que pregava a promoção da saúde da população, “através de parcerias, órgãos federais, estaduais e municipais, iniciativa privada e sociedade”.
Para ela o que define se uma entidade é pública ou privada é a gestão, por isso o PLP-092 é uma distorção. Clair acredita que ela vai permitir a abertura de uma “segunda porta” nos hospitais, o que significa que eles serão privatizados.
Para ela, a proposta inicial das fundações é “exatamente como está na Reforma de Estado de Bresser Pereira”. Ela defende que isso seja dito, pois “o povo vem sendo dominado e enganado ao longo do tempo”. Clair diz que o governo federal está ampliando as propostas neo-liberais e “promovendo o Estado mínimo para o social e máximo para o capital”.
Clair Castilhos ainda informou que a proposta do PLP-092 foi amplamente debatida e “rejeitada por unanimidade” na 13ª Conferência Nacional de Saúde.
Em São Paulo estão privatizando até grupo escolar e hoje existe até grife de sopa nos hospitais
Servidores na mira
Flavio Magajewski, da Secretaria Estadual de Saúde, começou sua intervenção dizendo que teria uma “posição um pouco diferente” dos colegas da mesa. Ele defendeu as fundações, afirmando que no sistema atual de gestão “falta dinheiro”, existem dúvidas em relação à qualidade e, ainda, que o sistema está “cheio de amarras legais”.
Segundo ele o PLP 092 é uma forma de melhorar a gestão pública, de uma forma mais ágil e qualificada. “Não existe proposta melhor que esta”, destaca.
Flavio Magajewski também fez declarações que deixaram os trabalhadores preocupados. “Não devemos ser saudosistas em relação ao SUS”, conclamou. “Hoje os servidores têm baixíssima produção”, disse também, atribuindo uma possível “má qualidade” nos serviços à classe trabalhadora.
À beira da desgraça
Rodrigo Borges, um dos coordenadores do Sintufsc, afirma que o debate sobre fundações não está sendo feito com a população, que, segundo ele, “será a mais afetada e não foi sequer consultada”. Ele entende que o projeto significa a entrega de bens públicos para o setor privado.
Rodrigo também destaca vários pontos que considera negativos no projeto. Diz que os trabalhadores vão ser ainda mais precarizados e regidos pelas regras da CLT; que não há garantia no orçamento da União; que o patrimônio, onde as fundações serão implantadas, deixa de ser público, e permite penhora de bens. As fundações irão trabalhar “dentro da lógica do mercado”, adverte.
Para ele, a aprovação deste projeto significa a “omissão total e definitiva do Estado brasileiro”. Por isso, diz Rodrigo, os trabalhadores de todo o Brasil travam a luta contra este projeto, considerado por eles como nefasto. Ou seja, que “causa desgraça”.
Depois das intervenções da mesa foi aberto o debate e várias pessoas da plenária fizeram questionamentos e observações. Raquel Moysés, também da coordenação do Sintufsc, condenou os argumentos de Flavio Magajewski, que atribuíram uma “má qualidade” do SUS à “ineficiência e pouca produtividade dos trabalhadores”.
Para ela o PLP-092 é mais um “modelo absurdo de apropriação de tudo o que é público”. Disse também que ele representa mais uma forma de “privatização disfarçada”, como as PPPs, OSs e OSCIPs.
Afirma ainda que tudo faz parte de um grande projeto, de apropiação de fundos, diz Rodrigo, públicos pelo setor privado, assim como o PAC, já batizado de “Plano de Acumulação Capitalista”.
